PUBLICIDADE

segunda-feira, 4 de junho de 2012

Terceira parte da saga "60 anos da Willys-Overland no Brasil"


Projeto da Renault francesa, o Dauphine foi o passo seguinte da Willys: um
carro compacto com motor traseiro de quatro cilindros e 850 cm3
Por Roberto Nasser
Especial para Uol Carros (*)

Joseph Frazer saiu do negócio, e os Kaisers, acostumados a fazer muitos lucros mais rápidos — aço, construções —, não deram o braço a torcer, optando por resumir a operação, olhar para o mercado externo. Rápido, Edgar Kaiser, herdeiro, marcou viagem à América do Sul. Passo definidor.   No Rio de Janeiro, após anunciar os planos num jantar, ouviu do Chanceler Oswaldo Aranha — pai do seu representante — que nenhuma das empresas de automóveis aqui instaladas, incluindo a General Motors, prestava serviços ao País, sem desenvolver uma indústria. Fosse pelo peso institucional de Aranha, ex-embaixador nos EUA, com livre trânsito no país, referenciado mundialmente como o brasileiro que abriu a primeira conferência da ONU, outra consequência do pós-guerra; fosse pela situação e números, por dossiê de Hickman Price, então seu funcionário, pelo champanhe que dá coragem, Kaiser respondeu à altura: fazer 50 mil por ano, para vendê-los a US$ 2 mil, ao mercado interno e de exportação. E completou: com 30% de peças nacionais.  

Demorou, atrapalhado pelo suicídio de Vargas. Meses após, Edgar Kaiser veio para os finalmente, decidindo a operação em São Paulo, onde mais crescia a indústria de autopeças. E sobrevoando fazendas em São Bernardo do Campo, SP, seu piloto particular sugeriu um platô, perto de duas estradas ligando com a capital, uma com o porto, para iniciar sua fábrica. Objetivo, Kaiser nomeou-o diretor, fiscal pessoal do empreendimento. Seu nome era William Max Pearce; era engenheiro e piloto de caça na recém-encerrada Guerra da Coreia. 

Começa  

É a terceira fase. A Willys não perdeu tempo. Manteve importação, montagem e distribuição a partir do Rio de Janeiro e, em paralelo, construiu amplo prédio onde instalou a linha de montagem que abrigava o restaurante industrial para funcionários. Orgulhava-se: no fim de 1954, cumpria a promessa de 30% das peças do Jeep Universal serem nacionais.

Solidez e resistência apregoadas na publicidade não se confirmavam na prática;
 este bruto era chamado de "Bernardão", o Jeep alongado de quatro portas
O "Barracão", como chamara o que orgulhosamente no Brasil se denominava "A Pioneira", era prédio simplório, visível da Estrada do Vergueiro, ligando o bairro do Ipiranga ao Caminho do Mar — ainda não havia a Via Anchieta —, e apresentava enorme logomarca em neon: Jeep.  O prédio existe. É o galpão 4 na grande estrutura industrial hoje operada pela Ford.  Para viabilizar fluxo e controle industrial, Price logo comprou a fundição da Máquinas Piratininga, em Taubaté, SP, e, além de caixas de marchas e transmissões, em 1958 desmentiu teoria de engenheiros norte-americanos, do ser impossível vazar — fundir, fazer — motores no Brasil, pois o clima tropical não daria bom comportamento mecânico aos metais. Foi o primeiro motor a gasolina feito localmente.

Price, bom de serviço, foi para a Mercedes-Benz ser presidente e, logo após, levado aos EUA, ministro do governo Kennedy.  Saiu Price, ficou Pearce com maiores poderes. Dinamizou o negócio por conta da favorabilidade das condições, em especial ter os meios industriais, autonomia, geração local do fluxo de caixa — e os produtos mais adequados ao Brasil daquele tempo: Jeep, logo a Rural, o grande salto de nacionalização com motor próprio, três anos antes dos concorrentes, picape Jeep. O motor BF-161, com válvulas em "F" — admissão no cabeçote e escapamento no bloco —, foi desenvolvido para tocar geradores de luz, ser motor auxiliar, mover barcos. O do Dauphine, abaixo citado, também.   Retrato do País, acredite, o Jeep foi durante alguns anos o veículo mais vendido. Em 1959, passo grande e valente, associada à Renault, entrou no caminho dos automóveis, indo ao outro extremo da escala da resistência, construindo pequeno sedã Dauphine — e dinamizou aproximar frágeis europeus da inimaginável realidade brasileira da ausência de asfalto, estradas, gasolina ruim, mecânicos desinformados... 

Sem êxito nos EUA, o sedã Aero Willys encontrou adequação no Brasil; em 1963 ganhava
linhas mais imponentes (embaixo), de projeto local
Manteve a direção o sedã Aero-Willys, em 1955 descontinuado nos EUA pois, pelo gosto dos compradores de lá, relativamente aos concorrentes Ford, Chrysler, Chevrolet, era pequeno, com motor idem — o seis-cilindros de 2,6 litros e 90 cv —, tinha rolar áspero. Mudou a escrita. Nem tudo que não é bom para os EUA é ruim para o Brasil. Aqui o Aero foi sucesso por suas dimensões, equilíbrio entre consumo e rendimento, bom torque em baixas rotações no motor, resistência.   Atrevimento   Pearce manteve visão, agilidade, rapidez e coragem para agir, criando fatos para conseguir resultados. Adequou a fábrica para produzir o Gordini, evolução do Dauphine, mantendo o motor de quatro cilindros traseiro de 850 cm³, evoluído para 40 cv, e câmbio de quatro marchas em vez do pioneiro de 31,5 cv e três marchas. Adquiriu à francesa Alpine pequena fábrica de carros esportivos com mecânica do Gordini, direitos de produção e transmissão de tecnologia para construir o esportivo aqui chamado Interlagos, feito em versões Berlinette, Coupé e Conversível.

(*) Reprodução autorizada pelo autor ao Blog Sou Jipeiro

Continua na edição de amanhã.

Nenhum comentário:

Postar um comentário